quarta-feira, 29 de abril de 2015

Festas milionárias de Zé Pretinho gera Ação Civil Pública por improbidade administrativa.

O juiz da Comarca recebeu uma Ação Civil Pública em que o ex-prefeito José Bispo Santos, sua ex-tesoureira, Márcia Raquel Santos Bastos, e os empresários Marcelo Almeida Cincurá e Roberto Costa Santos figuram como réus no processo de autoria do Ministério Público Estadual. Os bens dos envolvidos estão indisponíveis e as contas bloqueadas.

No ano de 2005, quando Zé Pretinho estava prefeito, o quarteto gerou um prejuízo ao erário no valor correspondente a R$ 302.478,00 (trezentos e dois mil, quatrocentos e setenta e oito reais). O valor é fruto de quatro contratos firmados entre a municipalidade e a empresa Folião Produções e Eventos LTDA, sem o devido processo legal de licitação.

Segundo a fundamentação do juiz prolator da sentença, a tesoureira assinou juntamente com o ex-prefeito, e fez o saque do cheque na boca do cofre, entretanto o cheque estaria vinculado aos contratos firmados, portando deveriam ser depositados na conta da empresa contratada. Nas investigações o Ministério Público encontrou indícios de fraudes em dois processos licitatórios e num deles, a prefeitura fez dois eventos festivos com, apenas, um contrato.

O juiz bloqueou os bens e as contas dos réus no valor correspondente a R$ 907.434,00 (novecentos e sete mil, quatrocentos e trinta e quatro reais), em face dos prejuízos causados ao erário e o suposto enriquecimento ilícito dos envolvidos. Um dos empresários réu no processo é o principal fornecedor de combustível à Prefeitura Municipal de Una na atual administração. 

Da decisão cabe recurso.

Veja a decisão na íntegra
0000789-81.2008.805.0267 - Ação Civil Pública
Autor: Ministério Público de Una
Reu(s): Jose Bispo Santos, Marcelo Almeida Cincurá, Roberto Costa Santos e outros.
Advogado(s): Margot Maria Elizabeth Kunzendorff, Oziel Bomfim da Silva, Marcio Cunha Rafael dos Santos, Antonio Jorge P. Peltier Cajueiro, Marco Aurélio Lelis de Souza, Demetrio Loures Rafael dos Santos
Decisão: Trata-se de ação civil pública por prática de ato de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público em face de José Bispo dos Santos, Marcelo Almeida Cincurá, Roberto Costa Santos e Márcia Raquel Santos Bastos.
Em síntese, alega o Ministério Público que os mencionados Réus se uniram para realizações de eventos festivos no Município de Una, com pagamento pelo Município para uma Empresa Folião Produções e Eventos LTDA com fraude em processos licitatórios.
O Autor juntou inúmeros documentos para comprovação de suas alegações, inclusive dos contratos firmados nos períodos de mandato eletivo do primeiro Réu.
Devidamente notificados, os Réus apresentaram suas alegações preliminares com base no artigo 17, §7º, da Lei 8.429/92, 
O Réu pugnou pelo arquivamento da ação, alegando em suma não ter praticado qualquer ato ímprobo.
A Ré Márcia Raquel dos Santos Bastos requereu também o arquivamento alegando em sua defesa que exercia cargo em comissão e todos seus atos foram realizados por ordens dos superiores, ou seja, as emissões de todos os cheques somente ocorria por ordens expressas do Chefe do Executivo.
O Réu José Bispo Santos, suscitou preliminar de inaplicabilidade da Lei 8.429/92 para prefeitos em virtude da existência do decreto-lei 201/67 e por tal razão o feito não deve ser recebido em relação José Bispo dos Santos.
O Réu Roberto Costa Santos alega em sua defesa que o único fato que o Ministério Público aponta como sua participação seria providenciar uma “procuração falsa” para o Réu Marcello, que tal fato não é verídico, porém ainda que fosse não configuraria improbidade administrativa.
Arguiu preliminar então de ilegitimidade passiva, carência de ação porque o Ministério Público ajuizou ação civil pública e não ação de improbidade administrativa, no mérito negando a existência de improbidade requerendo o arquivamento dos autos.
É o relatório.
O primeiro contrato entabulado entre o Município e a Empresa Folião Produções e Eventos, representada pelo Réu Marcello Cincurá de número 039-A foi realizado com inexigibilidade de licitação para contratação de artistas desconhecidos para evento festivo. 
O segundo contrato, apesar de haver licitação na modalidade convite, com 3 (três) possíveis convidados, houve violação no horário em que seria divulgado o resultado (folha 251). 
O terceiro contrato também foi realizado entre o Município e a Empresa Folião Produções e Eventos, com inexigibilidade de licitação, contratação feita no dia 15 de julho de 2005, sendo que o evento festivo é o mesmo do segundo contrato, com serviços distintos. 
Os três contratos estão juntados às folhas 303/308. 
Existe ainda um 4º contrato celebrado entre a Administração e mesma empresa, novamente para apoio às festividades. 
Há ainda afirmação de cheques endossados para a própria tesouraria municipal de Una e sacados na boca do caixa, conforme tabela de folha 12, assinados pelo então Prefeito, José Bispo dos Santos e por Márcia Raquel Santos Bastos, embora os cheques estivessem vinculados às contratações. 
Entendo que existem fundamentos suficientes expostos na peça inicial, confirmado pelos documentos acostados, de que a presente ação deve sim ser recebida e devidamente processada. 
Em tese, os atos praticados pelos Réus se afiguram sim improbidade administrativa prevista no artigo 9º, II e XI, 10, inciso, I, VIII, IX e XII, e ainda ao artigo 11, da Lei 8.429/92. 
A preliminar suscitada pelo Réu José Bispo dos Santos deve ser afastada porque a lei 8.429/92 é sim aplicada aos Prefeitos, embora existente o decreto-lei 201/67. 
É evidente que mencionado decreto-lei dispõe sobre crime de responsabilidade de natureza penal e outras infrações de natureza político-administrativa. 
A ação de improbidade administrativa por sua vez tem natureza cível, não havendo “bis in idem” em caso de punição pela mesma conduta, porquanto existência de independência entre a esfera cível, criminal e administrativa. 
O próprio STF no AI 678927, ao julgar o Agravo Regimental, reconheceu que os prefeitos não gozam de foro por prerrogativa de função em julgamento de ação de improbidade administrativa (lei 8.429/92), reconhecendo não só a natureza cível, como a possibilidade de o prefeito responder por improbidade administrativa. 
Também não reconheço ilegitimidade de parte da Ré Márcia Raquel Santos Bastos, pois há indícios sim de seu envolvimento nas práticas ilícitas. 
No tocante ao Réu Marcello Almeida Cincurá não houve negativa desse nas contratações, afirmando apenas não ser falsa a procuração que lhe concedeu poderes para tais atos, bem como entendo presente elemento suficiente para comprovar a participação de Roberto Costa Santos na empreitada, em virtude dos contratos de cessão outorgados a Marcello para tais contratações. 
Também afasto a preliminar arguida por Roberto Costa Santos acerca do rótulo da ação “ação civil pública por ato de improbidade administrativa” ou “ação por improbidade administrativa”, porque completamente infundada. 
Diante do exposto, RECEBO A PRESENTE AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, determinando a citação dos Réus para apresentarem contestação no prazo legal, sob pena de incidirem nos efeitos da revelia.
Outrossim, há fumus boni iures, inclusive com recebimento da presente ação civil pública de improbidade administrativa, porque inúmeros documentos demonstram cabalmente a possibilidade da prática de improbidade administrativa que gerou enriquecimento ilícito de terceiros e prejuízo ao erário, e ainda afronta aos princípios administrativos. 
O periculum in mora, conforme consolidada jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, é presumido, logo entendo por bem deferir o pedido de indisponibilidade de bens dos Réus.
O valor dos contratos perfaz R$ 302.478,00 (trezentos e dois mil, quatrocentos e setenta e oito reais), motivo pelo qual, levando-se em consideração as possíveis penalidades aplicáveis com base no artigo 12 da Lei 8.429/92, entendo por bem proceder a disponibilização de patrimônio dos Réus na ordem de R$ 907.434,00 (novecentos e sete mil, quatrocentos e trinta e quatro reais). 
Determino ainda expedição de ofício à Corregedoria do Tribunal de Justiça da Bahia para que todos os Cartórios Extrajudiciais de Registro de Imóveis do Estado informem a este juízo, no prazo máximo de 30 (trinta) dias sobre a localização de bens imóveis em nome dos Réus, procedendo gravame com cláusula de indisponibilidade do mencionado bem.
Expeça-se ofício ao Cartório de Registro de Imóveis desta comarca para que antecipe tal busca, informando se os Réus possuem bens imóveis ou foram proprietários desde 2005.
Determino ainda o bloqueio “on-line” de ativos financeiros dos Réus no valor acima mencionado. 
Intimem-se. 
Una – BA, 24 de abril de 2015. 
Maurício Alvares Barra 
Juiz Substituto